Por Adriano Espíndola Cavalheiro,
Especial para Anota.
Não conheço o V.M.C. pessoalmente. Ele é um policial militar que se envolveu numa trágica ocorrência policial, em fevereiro de 2014, na qual restaram mortos um usuário de drogas chamado Ad. e um experiente praça da PM Mineira, Sargento Reg.
Em texto bem escrito divulgado em rede social da internet, o mencionado policial que também é jornalista, revelou detalhes de uma tragédia - que apesar de refletir o drama que envolve a questão das drogas - parece não sensibilizar as elites para quais governam o país os partidos de oposição ou de situação, ou melhor, da direita clássica e da nova direita, leia-se, a esquerda light, que está no poder.
Antes de continuar, quero manifestar meus sentimentos aos familiares e amigos dos mortos na tragédia acima mencionada e, ainda, meu respeito ao trabalhador policial VMC, que pelo seu texto revelou-se extremamente humano.
Mas voltando ao assunto que me fez escrever esse texto, é certo que o avanço impune do tráfico transforma pessoas como o jovem Ad. em verdadeiros zumbis, mortos vivos transtornados, pelo vício das drogas. Quantos usuários não existem em Uberaba, em Minas Gerais e no país que perderam o controle da própria vida? Pessoas que se tornaram escravos do vício, largando e/ou perdendo tudo para as drogas como o craque?! Esse é um número incontável. As cracolândias estão aí comprovando isso.
Mas, então, poderia ser questionado: Diante de um quadro tão grave, de um problema social gritante como o aqui em comento, porque não assistimos esforços verdadeiros, como os que são voltados para a realização da Copa no Brasil, na recuperação dos viciados em craque e no combate ao narcotráfico? Porque não se constroem clínicas públics para recuperação como forma de enfrentar o vício? Porque manter uma erva como a maconha na ilegalidade, reforçando os cofres dos narcotraficantes (e dos banqueiros onde esses aplicam seus dinheiros), enquanto o Uruguai, países europeus e até mesmo vários estados do EUA já a legalizaram, sendo ela quase do mesmo nível do que o álcool?
Por falta de tempo e para não alongar por demais esse texto, arrisco apenas uma respostas parta todas essas perguntas: É porque - seja financiando os políticos, sejam investindo dinheiro sujo em pomposas aplicações financeiras bancárias - OS GRANDES TRAFICANTES, ao contrário do que muito pensam, SÃO BEM QUERIDOS NA SOCIEDADE CAPITALISTA. AS VULTOSAS QUANTIAS DE DINHEIRO, QUE A INDÚSTRIA DO TRÁFICO RENDE PARA SEUS PROPRIETÁRIOS, OS GRANDES TRAFICANTES, infelizmente, É MUITO BEM VINDA NA SOCIEDADE. ALÉM DE APLICAÇÕES FINANCEIRAS NO SISTEMA BANCÁRIO, OS TRAFICANTES - refiro-me aos donos do negócio e não ao pé rapado que vende droga na esquina ou faz aviãozinho - SÃO DONOS GRANDES PROPRIEDADES E NEGÓCIOS, FINANCIADOS COM O DINHEIRO DO TRÁFICO.
Mas, ainda que se entenda que o uso de drogas é questão de cadeia, o que não concordo, pois para a cadeia devem ir os grandes traficantes e seus subordinados, vez que o usuário é antes de tudo vítima de criminosos inescrupulosos, é fato incontestável que o sistema penal brasileiro encontra-se falido. Aqui cadeia não serve para punir, quiçá para recuperar o detento. As cadeias e penitenciárias brasileiras são verdadeiras escolas do crime, onde o apenado tem como destino - e são raros o que dela escapam - se tornarem pior do que eram quando nelas entraram. O índice de reincidência e a exclusão do ex-dententos comprovam esses fatos.
Já as polícias, civil e militar, são parte deste sistema falido, sendo o caráter militar das PM's parte deste todo que precisa ser revisto, refiro-me ao sistema penal brasileiro.
Ora, em que pese o respeito ao policial Vinícius e pelo texto por ele publicado, cuja leitura levou-me escrever esse artigo, o militarismo da PM visa trazer paz, da mesma forma que qualquer exército almeja a almeja (paz) quando em combate, isto é, derrotando o inimigo. O problema é quem é o inimigo das Polícias Militares, contra quem ela trava essa guerra. Ao contrário dos exércitos que combate outros exércitos as PM’s tem do outro lado a sociedade, em especial os membros desta que agem questionando - de qualquer modo -o “estatuto social”, ou seja, a situação atual de nossa sociedade, o status quo, que permite a manutenção da elite como elite e a impunidade dos políticos e autoridades corruptas que as servem.
Os assassinatos de Amarildos país a fora (em sua maioria absoluta impunes), os Batalhões de Choque e os policias infiltrados no movimento social comprovam o que eu digo, ou seja, que a PM não combate apenas criminosos mas guerreia contra quem é indesejável para as elites ou, ainda, questiona os desmandos do país.
Por isso entendo e defendo abertamente que não deve existir polícia militar, mas sim uma única instituição policia civil, controlada por conselhos de segurança, da qual façam parte policiais e a sociedade, com delegados eleitos pela sociedade e comandantes eleitos pela tropa. Ela deve ser bem equipada, não para reprimir trabalhadores, mas para prevenir a criminalidade e investigar eficazmente todos os crimes, inclusive, os cometidos por magnatas e/ou contra os cofres públicos. Os policiais, em vez de opressão por parte de seus superiores, como trabalhadores que são, devem ter direito de organizarem-se sindicalmente, para lutar por seus direitos.
Que fique claro o que aqui estou defendendo: a desmilitarização das Polícias como forma de melhora para a própria polícia e para o sistema penal. A proposta de desmilitarização tem dois elementos muito importantes. O primeiro é a unificação das forças policiais em marcos civis e o segundo é o fim do código militar. Nesses termos, desmilitarizar da Policia acarretaria o fim da separação entre o trabalho de investigação, de um lado, e do policiamento de rua, de outro. E os policias seriam julgados na justiça comum e não seriam oprimidos por oficiais muitas vezes autoritários.
A desmilitarização, compreendida nos termos expostos acima, seria um importante passo para combater o caráter autoritário das polícias no país. A PM não tem como problema principal a “dificuldade em conviver com o regime democrático”. Ao contrário: ela é peça fundamental da manutenção de uma democracia cuja existência normal depende da perseguição aos rolezinhos, da criminalização dos movimentos sociais, do forte controle dos trabalhadores e do povo pobre. Ela é um primeiro passo no ato de repensar toda a estrutura de segurança pública e o papel das próprias policias.
Mas, voltemos às prisões. Elas devem servir para punir e recuperar. O ócio não pode continuar reinando nos presídios brasileiros, tampouco, eles devem ser transformados em campos de trabalho escravo, como defendem alguns. Os presos devem sim estudar e trabalhar, primeiro passo para a recuperação e reinclusão social, mas devem receber por seu trabalho.
Além disso, deve-se investir em Educação. Construir escolas e cuidar da formação de qualidade de novos professores e na atualização permanente dos atuais é uma tarefa que todos devem exigir dos governos municipais, estaduais e federal. A legislação deve também mudar, não para impor penas mais duras, como a de morte ou para diminuir a maioridade penal (medidas defendidas por reacionários e que acaba encontrando eco na sociedade), mas para que as penas sejam efetivamente cumpridas e os presos recuperados, bem como para que políticos corruptos e empresários corruptores, sejam realmente punidos e tenham seus bens confiscados. Teatros, como o do mensalão petista, ou impunidade, como a do mensalão tucano, não pode ter mais lugar.
Enquanto não se avançar neste sentido, tragédias como a que se abateu sobre Uberaba, resultando nas mortes de Ad. e de Reg., continuaram a assombrar nosso cotidiano.
Adriano Espíndola Cavalheiro é advogado militante e articulista da Agência de Notícias Alternativas. Mantém o blog Defesa do Trabalhador - (blog integrante da rede ANOTA). É militante da CSP- Conlutas. Contato: defesadotrabalhador@terra.com.br
A DIVULGAÇÃO, CITAÇÃO, CÓPIA E REPRODUÇÃO AMPLA DESTE TEXTO É PERMITIDA E ACONSELHADA, desde que seja dado crédito ao autor original (cite artigo de autoria de Adriano Espíndola Cavalheiro, publicado originalmente pela ANOTA – Agência de Notícias Alternativas)